Manchetes

Uma crítica ao Lula ou um drama para a esquerda

Por Alexandre Capelo – Lula teria tudo para ser um ótimo ministro da Casa Civil. Esta pasta é política pura. É a responsável pelas diversas articulações do governo. E Lula é um articulista sem igual. Seu pragmatismo governista poderia conferir a estabilidade que o país tanto necessita. Até “o mercado” reconheceu isso, com as alterações na Bolsa de Valores.

Lula é o ex-presidente que mais conhece o Brasil, os bastidores do poder, e alguém que já deu provas de saber “governar para todos”, isto é, beneficiar mais os ricos do que os pobres _mas é um ídolo por ao menos olhar os desfavorecidos com compaixão, não apenas buscando uma troca (ou venda) de votos. Não fez assistencialismo do tipo Papai Noel com presentes, pula pula em Dia das Crianças, coelhinho de páscoa em Abril, botijão de gás emprestado, cesta básica sometimes. Fez política pública. Premiada internacionalmente. 

Lula é o cara que pode chamar os partidos e dizer: “Ok, meninos. Vamos arrumar a casa”, ainda que este “arrumar” seja: vamos manter os juros altos, a dívida galopante, o desmatamento, o latifúndio… Se esta caminhada é a que queremos, é outra história. Mas é um caminho a seguir. Um caminho que (e este é um drama para a esquerda) cativou amplos setores da alta roda da grã-finagem e da arraia miúda. Bancos e empreiteiras injetaram milhões nas campanhas. A população mais humilde referendou seus governos, ainda que com críticas. No fundo, sabem que “não são todos iguais”.

.

Na linguagem das ruas, Lula “tem o proceder”. Pode ser um bandido, mas é o óleo necessário para fazer a máquina voltar a andar, em um sistema político e econômico corrupto per se, pois que baseado no financiamento privado das campanhas _mais uma página não enfrentada pelo PT e que agora cobra sua conta com juros estratosféricos, da ordem de 200 políticos em lista de uma única empresa ou R$978 BI em dívida pública (2014).

Vimos pessoas que não sabiam nada de Energia assumirem o Ministério de Minas e Energia; Gente que não sabia nada de Esportes assumir esta pasta. E a lista poderia continuar. Quando, finalmente, nomeiam para uma pasta de negociações alguém especialista no tema, resolvem caçar. É uma perseguição específica, pontual.

Não se trata de atacar toda a esquerda “depois disso”… Dificilmente veremos um golpe ditatorial, que acabe com todas as garantias democráticas. Isso não é mais necessário, seja por não estarmos mais vivenciando uma Guerra Fria, seja pela subserviência do governo aos interesses poderosos, seja em virtude do amadurecimento das instituições nacionais, seja pelos ataques já legalizados que restringem diversas garantias democráticas (Lei Antiterrorismo, MP 699/15, etc), seja pela inexpressividade de atores que ameacem o establishment.

A esquerda já não existe. O PT trabalhista é uma ficção. Comunista então, esquizofrenia da classe média. Os verdadeiros comunistas (PCB) tiveram apenas 47 mil votos em todo o país _um Itaquerão. Somados com PSTU e PCO, os “vermelhos” totalizam algo em torno de 150 mil votos _dois Maracanãs. Quem se destaca muito à frente de seus primos de esquerda é o PSOL, com os mais de um 1,6MI votos de Luciana Genro _é um Recife completo. O problema é que, somados todos, os quatro partidos não conseguem ultrapassar a população de Curitiba. Quando coloca-se os números na ponta do lápis, percebe-se o tamanho do abismo que separa a classe em sida classe para si. Todo um país diz ser contra a corrupção e querer a melhoria da qualidade de vida, mas apenas 1,70% dos votantes fecham com quem realmente encarna estas bandeiras. 

Este é mais um drama da esquerda socialista, a única força que possui genuinamente uma saída para a crise político econômica, um projeto de nação e um vislumbre de esperança para os trabalhadores, especialmente os jovens e os de classe média baixa e baixa. Os únicos partidos brasileiros que não foram citados na Lava Jato, os que realmente dispõem  de uma conduta “moral e ilibada”, poderiam ser confinados em uma única cidade do país. Colocar-se contra a corrupção e não votar nos únicos partidos que não são corruptos é dureza. Ironia maior: é justamente de Curitiba que partiram os golpes que mais acaloraram as mesas de boteco, almoços de família, os corredores empresariais, os celulares… e que podem esfacelar o país.

Da mais recente perseguição a Lula, conclui-se, uma vez mais, que a direita não tem projeto de nação, de desenvolvimento. Sabe apenas se locupletar no poder. E quando outros também se beneficiam (licita ou ilicitamente), fica raivosa, espumante, irada, golpista.

O Brasil não comporta mais uma ditadura civil-militar. Mas um “golpe branco”, como o que ocorreu no Paraguai (2012), ou algo um pouco mais enérgico, como o de Honduras (2009) não está de todo descartado. Um acirramento como o da Venezuela (2002) está fora de questão. No Brasil, a burguesia tem ressentimento. Vai sangrando o governo para tentar se fortalecer. Na Venezuela, o ódio burguês chega ao ponto de esconder comida e incendiar prédios públicos. Se a “polarização das camisetas” já nos causa incômodo…

Mas, então, por que lutar contra o golpe, se o próprio governo viola ou é conivente com violações democráticas? De que democracia estamos falando? Daquela que nós temos. Daquela que vem sendo construída aos trancos e barrancos. Esta frágil democracia tupiniquim, na qual os perdedores precisam aprender a respeitar quem venceu. Na qual as pessoas precisam aprender o significado de solidariedade, justiça social, liberdade. Engana-se aquele que acreditar que as coisas irão melhorar se Dilma sair (leia-se cair, interprete-se ser derrubada). Quem assumirá será um governo ainda mais neoliberal, que retirará com mais velocidade as poucas conquistas dos governos PT_ por sinal já dilapidadas pelos próprios governos PT.

É preciso construir uma alternativa que exponha as causas do atraso nacional e defenda uma agenda concreta para reverter o atual impasse político econômico. Fazer isso só com a população de Curitiba não dá. Apenas com a de Recife, impossível. O Brasil é um continente, um pequeno cosmo particular. Os governos do PT revelaram parte deste país sertanejo, interiorano, miserável, sofrido, guerreiro, inovador, risonho. Mas a população do Recife e de Curitiba estão muito no litoral. Possuem ciência desse Brasil recôndito, mas o seu é outro.

O último drama reside no fato de que este Brasil, modificado nos últimos 13 anos, é composto por muita gente que, tomando Schin, julga ser Chandon. O seu colega de faculdade, trabalho, academia… É um reaça! Conservador, retrógrado, preconceituoso, despolitizado…. Não é o conde Scarpa, a família Safra. É o seu vizinho: porteiro, policial, faxineiro, pedreiro, auxiliar de operações, vendedor de loja, operador de telemarketing.

.

Por ora e por sorte, ainda é a elite branca quem está nas ruas pró-impeachment, majoritariamente. Mas a população já está pelas tabelas em suas casas e empregos. Mais um sensacionalismo global e um ataque mais duro podem levar mais alguns milhões às ruas. Quando isto acontecer, aí não haverá o que fazer.

Foram mais de 13 anos no poder e pouquíssimo salto no saldo da consciência de classe dos trabalhadores.Não se vendo enquanto tal, prostitutos de sua própria vida, os trabalhadores, com pequenas elevações materiais, já absorveram o ideário da burguesia. O que vemos nas ruas é uma construção mútua da direita mais nojenta com os traidores bem intencionados: um país em crise existencial.

Ao mesmo tempo esquizofrênico, por imaginar um “PT-comunista”; Com síndrome de Alzheimer, por esquecer facilmente o que foram os anos de chumbo e as conquistas sociais de até 5 anos atrás. Perdido por não se lembrar do passado e misturar todo o presente, o país corre sem direção, isto é, espera em movimento. Afinal, para onde vamos?

A direita vai levar. Com a força das ruas ou das urnas, duas táticas que a esquerda apostava para “chegar lá”. Venceram-nos. Levarão a batalha, ao que tudo indica. A questão é saber quando. Pode ser este mês com golpe, pode ser este ano com eleições gerais. Pode ainda ser em 2017, com eleições indiretas via Congresso mais conservador da Nova República. No tempo normal, na prorrogação ou nos pênaltis, a direita é favorita para ganhar. E para conquistar o Bi, 2016-2018. Aliás, já vem ganhando nestes 13 anos. Exceto pelo fato da elevação social de amplos setores, a direita está ganhando durante os 90min. Contudo, pode piorar.

O abortamento de Lula Ministro pode significar o fim do próprio governo. Querem a cabeça dele. Com a saída do PMDB, o último lastro político do PT se esvai. O apelo para o bom senso institucional e as regras democráticas burguesas parece estar definhando, quando se trata dos “não-amigos”.

Agora que o PT já cedeu os anéis para não perder os dedos; os dedos para não perder as mãos; as mãos para não perder os braços… Parece não haver muita saída a não ser perder a cabeça.Quem salvará um governo que atacou a muitos?

Nas esquinas, comenta-se: “Os ratos estão abandonando o barco. O último que sair apague a luz”.  O dilema é que os ratos não deixam de o ser após mudarem de navio. E mudarão! Sintomático é o caso de Paulo Maluf: o faro político que tantas vezes apostou no lado vencedor, acaba de lançar Alckmin à corrida presidencial e estuda o perfil de Bolsonaro.  O caçado pela INTERPOL ainda vai integrar a comissão que analisará o impeachment de Dilma. Ele e mais 7 membros da digníssima comissão redentora são réus no STF, respondendo por crimes de responsabilidade, eleitorais, contra o meio ambiente, contra o sistema financeiro e formação de quadrilha. “Ufa! Vamos limpar o país dessa corja de ladrões”, gritou o ingênuo útil. Os ratos estão se reorganizando.  A dedetização do navio, grande objetivo da Lava Jato, preservou os ratos e está afundando o navio.

Perdido no mar alto, longe de gritar “terra à vista” e ainda mais distante de um Porto Seguro, o governo insiste em procurar a Baía de Todos os Santos _o acordão nada santo que só Lula pode fazer com os demônios da política nacional. Enquanto permanecer no governo, o PT apenas aprofundará os ataques que já vem implementando para satisfazer a sanha vampiresca da burguesia. Quando sair, “homens ao mar!” e “salve-se quem puder”.

É hora de navegar por outros mares! A travessia do oceano é longa, mas nunca será feita sem as primeiras braçadas. Requer esforço.  E o primeiro passo é sempre  definir o rumo para onde nadar. É tempo de disputarmos os corações e construirmos a consciência dos trabalhadores. Faltam menos de 200 dias para as eleições _gerais ou municipais_ e sabe-se lá quantos até o barco naufragar. “À esquerda, à esquerda, à esquerda, marujos!”. 

Alexandre Capelo é Bacharel em Relações Internacionais pela USP e atualmente cursa História na mesma instituição. Filiado ao PSOL desde 2013, foi um dos organizadores das manifestações contra o aumento das tarifas em Osasco e está Conselheiro Municipal da Saúde de Osasco (2015-2016).

 

Concorra a prêmios surpresas ao fazer parte de nossa newsletter GRATUITA!

Quando você se inscreve na nossa newsletter participa de todos os futuros sorteios (dos mais variados parceiros comerciais) do PlanetaOsasco. Seus dados não serão vendidos para terceiros.

PlanetaOsasco.com

planeta

O PlanetaOsasco existe desde 2008 e é o primeiro portal noticioso da história da cidade. É independente e aceita contribuições dos moradores de Osasco.

Artigos relacionados

Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
Botão Voltar ao topo
0
Queremos saber sua opinião sobre a matériax